(continuação do post anterior...)
Essa história de destruir o meio ambiente. Vamos a ela.
Ok, tudo bem, o ser humano tem sido irresponsável com isso. Mas olhe só,
pessoa, há uma tremenda diferença entre ser irresponsável e maldosamente
destruidor. Nós vamos aprendendo conforme vivemos.
Época houve em que não
entendíamos os efeitos de nossas ações sobre o meio. Agora estamos começando a
entender e já estamos começando a tomar providências sobre isso, embora não com
a presteza necessária e é esta a irresponsabilidade. Mas atenção! Não é como se
praticássemos a destruição pela destruição, não é como se, ao poluirmos os rios
e mares, ao eliminarmos florestas e espécies, sentíssemos prazer. A imensa
maioria de nós, pelo menos. Ocorre que temos que usar os meios de que fomos
dotados para sobreviver e ao mesmo tempo, fazermos o que sempre fizemos:
aprender com nossos erros.
E isto nos leva de volta ao início. A nossa maldade
inerente. Que só será extirpada pela ação daquele “Senhor da misericórdia” que,
sem misericórdia alguma, teria nos lançado neste vale de lágrimas, para sermos
presas e vitimas do meio indefeso só que não, e para estarmos à mercê de
alguns de nós que também teriam sido criados pelo Deus. Deus este que teria nos
dado livre arbítrio para que pudesse testar o “amor” de alguns. A esta altura,
pessoa, penso que não precisamos deblaterar sobre como isso se choca com a
inerência da justiça do Deus, certo?
Oh, vejo que você não concorda. Agora você
me apresenta como argumento que há mistérios que apenas a Deus pertencem, que
não nos é dado conhecer todos os desígnios de Deus, pois ele é, além do resto,
a sabedoria. O que eu posso dizer? Que enquanto você pensa que está me
apresentando uma sólida explicação, eu estou vendo que você está arranjando
desculpas para o comportamento desse Deus, tão incongruente com os predicados
que o formam.
Eu estou observando, pessoa, que enquanto você pensa que está
defendendo sua fé e seu Deus, você na verdade está tentando me encurralar com o
desconhecido.
É mais ou menos como se você estivesse me dizendo que não posso
ter a arrogância de pretender saber sobre todas as coisas e que, por isso, as
incongruências desse Deus podem muito bem ter suas explicações abrigadas nesse
desconhecido, esperando o momento certo de serem desveladas e me desafiando a
provar o contrário.
Respondo a você que as probabilidades da lógica e da
razão continuarem soberanas mesmo no desconhecido são muito mais altas que a
possibilidade da existência desse Deus que torna improvável a sua própria
existência, nos termos em que é apresentado. Apenas para constar nos registros,
lembro o que já te disse duas vezes: se há um criador, do universo, dos seres
humanos, não é esse que você descreve, pelas razões já apresentadas. E neste
assunto, quem combate a razão é você, não eu.
Passemos então à questão da maldade humana, da forma como
você, pessoa, a vê.
Somos nós, humanos, tão maus que não merecemos a dádiva da
vida que esse Deus teria nos dado. Não há, para nós, chance de redenção fora
dos termos desse Deus, pois a maldade que nos é intrínseca nos impede de a
superarmos e sermos melhores.
Eu digo solenemente que não, pessoa, não é assim.
Começo por perguntar, pessoa: quem é que nos aponta
nossos erros, nossas falhas e faltas? Quem é que se horroriza ao ponto do
sofrimento intenso com coisas que nossos semelhantes cometem contra outros
semelhantes que nunca sequer chegamos a conhecer, ou contra outras espécies?
Quem é que se indigna com as coisas injustas?
Não são os leões na montanha, nem os lírios no campo.
Somos nós, pessoa. É, nós mesmos. Você consegue entender
isso?
Significa que nossa redenção se dá por nós mesmos.
Aos poucos, lentamente, vamos superando nossa condição
animal no que ela tem de bestial e fazemos isso porque somos capazes de
percebê-la e porque não a aceitamos.
Eu diria até que o que nos faz superiores não é o fato de
termos ultrapassado as limitações naturais a um ser tão desprovido,
comparativamente a tantas outras espécies, de vantagens evolutivas. Até por que
a própria natureza se encarregou de nos dotar com uma vantagem, que é nosso
cérebro.
Mas fomos ainda mais longe. Desenvolvemos autoconsciência; tornamo-nos
capazes de nos ver criticamente e assim fazendo, de desenvolvermos empatia num
alto grau. É por sermos capazes de autocrítica e empatia assim desenvolvida,
que sabemos que há coisas que ferem e destroem nosso semelhante, porque
poderemos estar no lugar de nosso semelhante em qualquer ocasião e por sabermos
que nossas ações ferem e destroem nosso semelhante. Nós somos nossos juízes.
Nós valemos a pena por nós mesmos, não pela suposta
dádiva de um improvável Deus, cuja existência, se real, o colocaria muito abaixo
de qualquer de nossos padrões de bondade, de amor e de justiça.
O que não somos é perfeitos, isso não. E não é provável
que em algum tempo venhamos a ser.
Mas avançaremos sempre muito lentamente na tentativa de
melhorarmos nossa natureza, de superarmos nossa parte bestial, enquanto não
entendermos que essa superação depende de nós, não do temor a um ser
improvável. E que nossa parte melhor é obra nossa, não desse ser.
Em suma, pessoa: a responsabilidade é nossa, as falhas
são nossas, os erros são nossos, mas os méritos também são nossos.
E sim, eu já percebi pessoa, que você não concorda
comigo, que se sente ofendido em sua fé. É até provável que pense que eu
merecerei todo e qualquer castigo que esse Deus achar por bem me dispensar.
Eu? Eu penso que estivemos aqui muito antes desse Deus
ser criado à nossa pior imagem e semelhança, por nós mesmos, movidos pelo medo e pela ignorância.
E que ele viverá tanto tempo
quanto permanecerem nossos piores defeitos.

Shirley
ResponderExcluirÓtimo texto para reflexão
Em resumo, Deus criou o homem conforme sua imagem com seu lado bom e mau deu-lhe livre arbítrio por amor a ele e se mandou deixando o circo pegar fogo, porquanto “a responsabilidade é nossa, as falhas são nossas, os erros são nossos, mas os méritos também são nossos.” E... Deus lavou as mãos.
Abç