Um ligeiro debate com um
teísta (ligeiro tanto pela superficialidade quanto pela brevidade), num fórum,
acabou por levar a uma reflexão um tantinho mais aprofundada de um pensamento
que me acompanha há tempos.
Nunca haverá possibilidade
de diálogo entre teístas e ateus, pois inexiste no vernáculo palavras capazes
de soar bem aos ouvidos teístas quando a conversa reflete a posição ateia no
que concerne à existência de Deus.
A razão é simples: quando um
ateu sustenta, dando suas razões, que não existe algo como Deus, o teísta sente
que não apenas está sendo posta em dúvida sua capacidade de discernimento, mas
as próprias bases em que fundamenta sua existência. Ele, teísta, existe por que antes que existisse, houve um criador.
Era bem mais fácil para o
teísta nos tempos em que as causas e funcionalidades de muita coisa que nos
rodeia era matéria de ignorância mutua.
Vivemos agora um período de
conhecimento cada vez mais acumulado, pouco mais resta ao teísta que uma fronteira a
qual denomina “Causa Primeira”. É nesta região do desconhecimento humano que o
teísta ainda encontra espaço quando se trata de apresentar fatos a respeito da
existência de Deus. Sendo a origem do que chamamos Universo matéria de
ignorância geral, não pode o ateu, obviamente, apresentar dados que provem a
inexistência de algum e qualquer deus como origem, lacuna da qual o teísta
avidamente se aproveita para colocar seu deus como a tal da “Causa Primeira”
para a existência do Universo.
Observo rotineiramente que
teístas sentem-se sempre mais confortáveis quando debatem com ateus que ao
questionamento: de onde/como surgiu o universo, dão respostas que remetam ao
“acaso”. Este tipo de resposta os teístas compreendem, embora combatam, porque
os coloca em terreno seguro, conhecido: há uma resposta, ainda que, para eles,
absurda.
O tipo de ateu que de fato
enfurece o teísta é aquele que, ao já citado questionamento, responde
candidamente não sei. Isso abala o
teísta, provavelmente pelo temor inspirado por uma pessoa que prescinde de uma
resposta, mas também por deixar o teísta num vazio de argumentos. Se o ateu não
reivindica resposta, significa que a “resposta” do teísta não tem, de fato,
qualquer relevância para o ateu, já que este quer dados concretos para poder se
posicionar. A existência de Deus não figura entre as coisas concretas, é
matéria de fé e no fundo o teísta tem consciência da fragilidade da própria
posição.
Por mais cuidado que esse
tipo de ateu, num debate com um teísta, use na colocação de seus pontos de
vista, por mais tato que demonstre, é praticamente inevitável chegar-se ao
ponto em que o teísta passará dos termos do debate ao ataque pessoal.
Nesse ponto o ateu é
comumente associado aos comunistas assassinos: Stalin, Pol Pot, Mao, Ceausescu, entre outros monstros.
É claramente dito que
qualquer demonstração de horror, choque e repúdio de um ateu a atos como
assassinatos brutais e quejandos não passa de hipocrisia, uma vez que ateus não
compartilham códigos de ética e moral comum aos demais – leia-se crentes nalgum
deus – sendo incapazes de ver algo de mal no estupro de um bebê, por exemplo,
devendo, portanto, encarar tal ignomínia como coisa natural e aceitável.
Afirmam também que ateus
desconhecem coisas como o amor e o respeito e valorização da vida.
Noutras palavras: ateus não
são seres humanos.
Chega a ser engraçada a
reação do teísta, devido à forma como se vale despudoradamente de um peso e
duas medidas, quando algum ateu chama atenção para os erros das religiões,
supostamente patronas da ética e da moral.
Assim temos que, quando são
apontadas coisas como as Cruzadas, a Inquisição católica, o apoio convicto de
Lutero ao massacre dos camponeses alemães pelos príncipes na Guerra dos
Camponeses, os padres pedófilos, os pastores que enriquecem a custa dos fiéis,
etc., o teísta responde que se está cometendo uma desonestidade intelectual,
descontextualizando o período histórico, ou que padres pedófilos e pastores
oportunistas não são verdadeiros crentes e nem representam os que o são.
Ou quando se fala de
muçulmanos que apedrejam adúlteros e enforcam homossexuais; que extirpam
clitóris de forma primitiva e brutal; de terroristas que explodem pessoas
inocentes e incautas, a resposta dá conta de que são exceções, ou que não
representam o verdadeiro Islão.
O ateu que tentar alegar que
comunistas como os já citados são ateus das demais religiões apenas e que para
eles Karl Marx representa, ideologicamente, o mesmo que Maomé para os muçulmanos ou Jesus para os
cristãos, estará não só perdendo tempo, mas expondo-se a mais acusações de mau
caratismo.
Por outro lado, há ateus que
estão longe de ser inocentes nesta história.
São aqueles que se imbuíram
da missão de extirpar a crença na vida das pessoas.
Uma coisa é apresentar um
ponto de vista sobre o papel muitas vezes deletério da crença, na existência
cotidiana, na organização da vida social.
Ou apontar as inúmeras
contradições que invalidam a pretensão das religiões em ser a origem e baluarte
das regras que possibilitam e promovem a civilização.
Outra muito diferente é se
pensar que seja aceitável impor uma visão de mundo aos demais, ou sair por aí
fazendo pregação explícita contra o fim da crença, das religiões.
No primeiro caso esse ateu
será a imagem exata daquilo que contesta. É próprio das religiões tentarem por
todos os meios impor sua visão de mundo a todos, seja pela força bruta seja
pela forma indireta da visitação domiciliar, da atração de crianças e até
famílias inteiras por meio de festividades e distribuição de doces, da pregação
televisiva, de promessas de solução de problemas graves... A lista é longa.
No segundo caso, esse ateu o
é das demais religiões, mas de forma alguma deixa de ser um crente. Crê na
“verdade” do ateísmo, crê na sua missão de levar o ateísmo pelo mundo, é, tal e
qual, um profeta, um apóstolo.
E nos dois casos está fadado
ao fracasso, além de contribuir para que todos os ateus continuem sendo anátema
para crentes.
Há ainda um terceiro tipo,
que acredita ser possível, por meio do diálogo, tornar ateus aos crentes.
Está equivocado este tipo e
não há perspectiva de obter sucesso.
Quando um ateu fala e
encontra eco em algum crente é por que este crente corre o risco de deixar de
sê-lo. Já a dúvida plantou suas sementes, já a resposta anteriormente
confortável começou a incomodar e pode se transformar em perguntas.
Não sendo nada fácil ser
ateu, o mais provável é que esse crente em dúvida cale a si próprio e se volte
para o conforto da ideia Deus, com raras exceções.
Este tipo de crente, não
raro, é o tipo que combate o pensamento ateu com mais fúria, mais disposição,
pois antes de tentar calar o ateu, está tentando calar a dúvida, que uma vez
admitida, não poderá ser facilmente eliminada.
Admitindo, claro, a possibilidade
de incorrer no mais fragoroso engano, penso que estamos nós ateus, e os
teístas, fadados a um permanente embate sobre aquilo que nos define. Que se
diálogo houver, será sempre conversa de surdos.
Shirley
ResponderExcluirJá desisti de discutir com certas pessoas que teimam com seus argumentos apenas pelo fato de estar indo contra ou para fazer valer sua palavra nem que seja pela desonestidade, usando de baixarias mostrando seu nível, colocando apelido nas pessoas, escrevendo palavras de baixo calão como se tivessem liberdade para se dirigir com seus debatedores dessa forma. O que eu vejo na maioria dos crentes é esse comportamento.
Me dá canseira e sinto que estou jogando palavras fora, desperdiçando meus argumentos com pessoas que não estar a altura de alcançar o verdadeiro sentido do que estou falando.
Eu já falei dos trols e continuo com minha opinião.
Um abraço, bom final de semana.