Vi essa tirinha no Facebook ontem, a propósito do tal dia internacional da mulher:
Lendo a fala da Mafalda a primeira coisa que pensei foi:
Como assim, o que você gostaria de ser se vivesse? O que a mãe da Mafalda está fazendo que não seja viver?Assuntei com o Tico e o Teco sobre os possíveis significados da graça da tirinha.
Eles se consultaram lá entre si e chegaram à conclusão que não havia intenção de graça, ou se havia, servia para temperar com uma pitadinha de humor o que é na verdade uma crítica ácida sobre a vida da dona de casa. Comunicaram-me o veredicto e me deixaram cismando sobre o assunto, indo eles próprios se ocuparem de estratégias que me permitissem dar conta das tarefas pendentes no decorrer do que eu chamo de meu dia de folga, que calha de ser as segundas-feiras.
Cismando passei meu dia, até concluir que não gostei dessa tirinha. Não gostei da tolice embutida nela, da leitura boboca, rasa e irresponsável da sua mensagem.
O que essa mensagem está dizendo é que ser dona de casa, mãe de família, esposa, é um não-viver e eu não gostei dela por várias razões.
A primeira, claro, por ser eu mesma todas essas coisas e oras, eu considero que estou vivendo, sem sombra de dúvidas.
Me ocorreu que não gostei da tirinha por sentir-me de alguma forma atingida pela mensagem, algo do tipo ver-se num espelho, não gostar do que está refletido e negar o que foi exposto.Mas não, não é por aí.
Claro está que a vida de dona de casa, esposa, mãe, e que ainda trabalha fora está muito longe de ser fácil.
Claro que há muitos momentos de frustração, tentando fazer com que os filhos e o marido entendam que é da responsabilidade deles também a manutenção da ordem e da limpeza do lar. Há vezes e vezes em que a gente entende perfeitamente como se sentiu Prometeu, recomeçando no dia seguinte tudo que vivera de véspera.
Claro que o cansaço se acumula, claro que há momentos em que tudo que se desejaria era estar a quilômetros de distância, num lugar de sombra e água fresca, sozinha.
E que atire a primeira pilha de pratos por lavar quem nunca parou e se perguntou para que exatamente se casou, ou alguma variação disso.
Não há dúvida de que uma mulher que se case, tenha filhos e assuma a responsabilidade de cuidar pessoalmente da família terá pela frente uma vida de sacrifício, em que dará de si um bom tanto a mais do que receberá de volta.
Eu penso que é exatamente nessa doação desproporcional que reside a essência da mulher.
Nós assim o fazemos porque podemos. No que diz respeito à manutenção de uma família, somos naturalmente mais fortes, resistentes e capazes de nos adaptarmos às situações, do que são os homens. Não digo isso querendo significar superioridade em relação aos homens, que isso não existe. Eles têm seus talentos e capacidades, nós temos os nossos, cada um em sua seara.
E nossos talentos e capacidades sempre são melhor aproveitados quando constituímos família e nos encarregamos de cuidar dela.
A família é a base onde se sustenta a humanidade. Quem disser ou pretender que pode ser diferente estará falando besteira.
Como é possível então que se possa dizer que uma mulher que se dedica a manter o conforto e a dignidade de sua família, por meio das tarefas domésticas, não está vivendo?
O que seria a vida, então? Não casar e não ter filhos? Muito válida opção para as mulheres que assim decidirem.
Para as que escolherem o casamento e os filhos, viver seria abandonar o cuidado com a casa? Não se preocupar com roupas limpas para seus filhos e porquê não , para o marido? Não se preocupar como se alimentarão? Deixar a casa se transformar num tugúrio infecto?
Viver será aceitar formar uma família para então todos estarem como bichos nas tocas?
Essa é uma consideração que escapou ao Quino, o autor da tirinha. Ninguém obriga uma mulher a se casar e ter filhos.
Mas se ela assim escolhe, fica implícita a responsabilidade de cuidar da família.
Ademais, essas tarefas, que podem ser, e a mais das vezes são, aborrecidas porque repetitivas, intermináveis, não se findam em si mesmas.
São uma demonstração de cuidado, de amor. Mas não o amor açucarado e irreal dos contos de fadas ou da visão narcisista e infantil que impera hoje em dia, que na verdade é um eufemismo para a auto-satisfação a qualquer custo.
Falo do amor de gente grande, da vida real. Do amor que exige alguma dose de renúncia, que seja pleno de responsabilidade.
A mulher que se dedica a cuidar da família está ensinando valores para seus filhos, que os acompanharão vida afora, valores que falam da necessidade de ordem, de disciplina, de responsabilidade, da diferença entre o que é viver uma vida civilizada e uma vida primitiva, de bicho. Não somos bichos.
Uma mulher que cuida da sua casa é uma mulher que se preocupa em assegurar a seus filhos que eles têm um lugar no mundo, preparado e cuidado para e por eles.
É também uma forma de respeitar o pacto que fez com o homem com o qual concordou, por livre e espontânea vontade, de formar uma família.
Se isso não é viver, não sei mais o que seja. E não é uma data qualquer no calendário que irá mudar o significado do que seja viver, para mim, se isso implica me sentir como uma espécie de zumbi.
Pé de página: fui assuntar sobre o autor da tirinha, Quino, só pra constatar que não há mesmo nada de novo sob o sol. O camarada é socialista, então está auto-explicada sua visão sobre a mulher dona de casa. Ela é uma minoria explorada pelo sistema burguês-capitalista.
O socialismo devia mudar de nome, devia passar a se chamar Coitadismo, já que só consegue lidar com o mundo contrapondo vítimas e vilões, com os coitadistas fazendo o papel de redentores da humanidade.
Erasmo Carlos, brega mas muito adequado: Mulher

Shirley,
ResponderExcluirPodemos dar um desconto? Uma coisa que tenho reparado é que ninguém considera o zethgeist (espírito do tempo). Analiza-se uma tirinha que deve ter sido publicada nos anos 70 ou 80 com a visão da nossa realidade que temos nos anos 2010.
Vamos pegar o que se esperava dessa mulher nessas décadas. As que trabalhavam ainda tinham que carregar a culpa de "não educar seus filhos" e de "não cuidar de seus deveres" (grifo na palavra "deveres"). Fora que toda mulher católica (pode-se excluir as "irmãs" do "Católicas pelo direito de decidir") afirma que uma mulher não é "completa" se ela não tiver um filho.
Teve um movimento recente em que mulheres abandonavam às suas carreiras para se dedicar à maternidade, e muitas feministas estrilavam com isso, alegando que seus sutiãs foram queimados à toa. Quer dizer, para um homem ser pai e ter uma carreira profissional não era incompatível. Para uma mulher, é.
E isso ainda ocorre hoje me dia. Sei que estamos longe de uma Dinamarca onde o homem pode pedir licença maternidade (ou paternidade, não ria...) mas acredito que o futuro é lá.
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ResponderExcluirmeio difícil dar esse desconto...rsrsr
Esse Zeitgeist sob o qual foi escrita essa tirinha nasceu na época da chamada liberação feminista e atua ainda hoje, segundo pude apurar lendo os comentários naquela página do facebook e segundo o que observo em geral. Uma coisa que ninguém fala é que a mulher que se diz oprimida é a mesma que cria o opressor. Sério, eu vejo isso acontecendo sempre. Mulheres que reclamam o tempo todo da divisão injusta das obrigações de cuidar da casa e educam os filhos homens para repetirem esse padrão e as filhas mulheres idem.
Cada uma faz a escolha que acha melhor, a minha foi considerar sim como meu dever priorizar meus filhos e cuidar da casa; fiz uma especie de aposta, se sobrevivesse á tarefa me concentraria numa eventual carreira depois que eles crescessem, e durante o processo trabalharia no que pudesse conciliar as duas coisas. Como foi uma decisão minha, não culpo ninguém nem me considero oprimida.
Isso de ser pai e ter uma carreira, em oposição às mulheres-mães, eu acho meio incompatível sim, pois criar filhos é uma tarefa absorvente e se dedicar a uma carreira também é e aí ou a mulher se dedica a uma coisa ou à outra. A gente não pode ignorar a biologia a tal ponto. Mulheres são mais capacitadas biologicamente para cuidar da cria, goste-se ou não disso.
Mas não seria mal se aqui algum dia os homens e as mulheres desenvolvessem um sentido de cooperação maior na lida da vida familiar.
Grifei mulheres por que não são só os homens que são machistas não...
Procure algumas feministas "light" como a LOLA ARONOVICH por exemplo. As mais radicais acabam justificando a existência do "orgulho hétero", já que umas tontas pregam que até a penetração no ato sexual é uma espécie de opressão masculina e defendem um sexo sem esse ato.
ExcluirQuer dizer, ignoram biologia, fisiologia e até engenharia, fora que nessa brincadeira quem perde é o homem (adivinha onde vem a maior parte do prazer masculino opressor...).